segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O fácil e o difícil

Agora é fácil, então, levante-se e se vanglorie por se julgar melhor que a anterior, em função da manutenção do amor, que o antigo amado desta, hoje nutre por você.
Sim, é fato, que se conseguiste pôr fim ao antigo amor, fazendo por força do destino, resistir ou florescer o amor por ti, tens glorias, mas as suas novas glórias não tiram nem excluem as glórias antes conquistadas. Até porque, para fazê-lo, teria que voltar o relógio do tempo até um tempo em que era mais difícil amar.


Imagem: Miguel Rômulo e Murilo Beneficio
(Representação fictícia de o antes e o depois)
Pois é fácil amar o homem feito, cheio de trejeitos másculos, segurança de si e vestes de homem bem sucedido. Difícil mesmo foi amar o nerd magrelo de calças jeans surradas e camiseta cheia de furos, largado no sofá da mãe, jogando vídeo game, em uma tarde de domingo. É mérito de quem conseguiu enxergar nele o homem vês agora, mas que naquele tempo, ainda não existia. 

É fácil amar o homem sensato, de frases pensadas e pausadas, que se cala para não magoar. Esse que conta as palavras e as atitudes para não piorar a situação. Difícil mesmo era amar aquele rapaz que explodia, dizia tudo o que lhe vinha a cabeça, que fazia mil besteiras e, depois, recorria ao amor que por ele se sentia para justificar a sua obrigação de perdoá-lo.

É fácil amar o homem que entende que sua inteligência independe do seu grau de instrução ou origem. Difícil foi amar aquele que fazia coro aos que diziam que não era porque você havia nascido na periferia e tinha poucos recursos, que deveria permanecer “sem instrução” para sempre, o que na época significava que, apesar de ter terminado o colegial (ou o ensino médio de hoje), você não era considerada instruída o suficiente para ele. 

É fácil amar o homem que a ama por quem você é em seu interior e não o que você faz da vida ou o quanto conquistou até agora. Difícil foi amar aquele que sempre exigia mais de você, esquecendo que você era só uma menina que apenas AINDA não tinha brilhado.

É fácil amar o homem que te apoia em seus projetos e comemora suas conquistas junto com você, difícil foi amar o rapaz que ao receber a notícia de que você havia conquistado uma bolsa para estudar em uma das melhores universidades do país comentou sua surpresa com a incapacidade dos demais por terem sido piores que você, a ponto de terem perdido a tal vaga, logo pra você. 

É fácil amar o homem que quer sempre estar ao seu lado e recompensá-lo por isso. Difícil foi amar o garoto que“fugiu”, no primeiro ano de namoro, para passar o carnaval sozinho em Guarapari, sem fazer contato por três dias. E não estou falando de amá-lo só a ponto de perdoá-lo pela mancada, mas o suficiente para passar vários dias cuidando dele na ausência dos pais que estavam na praia, para ajudá-lo a tomar banho, se vestir, entregar documentos na empresa, porque, a criaturinha, depois de três dias sem fazer contato, apareceu com a clavícula quebrada.

É fácil amar o homem que hoje enxerga super bem. Difícil foi ama-lo enquanto usava “óculos fundo de garrafa”, o suficiente para passar dias dormindo apertados, na cama de solteiro, para cuidar dele na recuperação pós-cirúrgica da vista ou para acompanhá-lo ao médico e segurar sua mão e conforta-lo na sala de espera da emergência do oftalmo, quando ele termia que não fosse só uma conjuntivite que o atacava, mas talvez um problema mais sério com a cirurgia da vista.



É fácil amar o homem que respira super bem. Difícil foi apoiar suas costas enquanto ele vomitava sangue no chão todo do quarto, depois da cirurgia do septo nasal. Difícil foi segurar sua mão enquanto o médico tirava dois dedos de luva de dentro dos seios nasais, o que fazia o sangue jorrar na toalha. Isso tudo sem sem sentir nojo ou repulsa, pois depois de certo tempo, o sangue do outro é como se fosse seu próprio sangue.

É fácil amar o homem que hoje lhe apresenta a casa completa, organizada e mobiliada, na qual você deseja só entrar e mudar colocar seus quadros no lugar dos antigos e quem sabe qualquer objeto de decoração para que se pareça mais com você. Porque difícil foi amar o rapaz o suficiente para ir pra essa mesma casa dormir em um colchonete sujo, surrupiado da caminhonete do pai, e aí em diante ter que conquistar a cada dia uma partezinha das coisas que hoje compõem essa mesma casa que este quer lhe entregar de bandeja.


É fácil amar o homem que se mostra forte, seguro e protetor a todo momento. Difícil é amar o rapaz que desaba na escada, quase em estado catatônico, quando a nossa casa é assaltada, tendo você que ficar dividida entre tomar providências quanto ao roubo ou acudi-lo de seu estado de choque.

É fácil amar o homem que demonstra amor a todo momento, difícil é amar o rapaz que acredita que demonstração de amor é igual a demonstração de fraqueza, então, toda música romântica é “de corno”, todo filme romântico é “mela cueca” e qualquer demonstração de afeto é “viadisse”.

É fácil amar o homem que reconhece seus erros e se preciso implora por perdão. Difícil foi amar o garoto que nunca se desculpava e quando errava se restringia a não falar mais sobre o assunto, pois, achava que jogar para debaixo do tapete era o melhor modo de lidar com as “sujeiras emocionais” do relacionamento.

É fácil amar o homem que tenta não te magoar nunca, difícil é amar o garoto que acha que não precisa mais ter cuidado em te magoar porque já te magoou tantas vezes (que mal faz mais uma vez? você aguenta! você supera!).


É fácil amar, por um ano inteiro, um homem que tem certeza do que sente por você e confirma a cada dia de que quer você por todos os dias dali em diante, confirmando o rótulo do relacionamento e cumprindo ritos como alianças e cerimônias. Difícil mesmo foi passar DEZESSETE ANOS com alguém que tinha dúvidas de tudo e se recusava por todas as formas e meios que encontrava a rotular e cumprir qualquer rito ou cerimônia que pudesse lhe deixar segura do relacionamento e do amor que possuía.

Parabéns pelo mais fácil, pra o mais difícil ainda faltam muitos anos... que talvez nunca cheguem, digo, não os anos, mas as partes mais difíceis.